É possível reconhecer irmão socioafetivo para fins de herança?

Vamos ao caso:

A falecida nasceu em 2 de outubro de 1929 e, aos 4 anos de idade, ficou órfã, sendo acolhida pelos pais dos recorrentes. O pai de “criação” faleceu em 1981 e a mãe em 2011. A falecida, que sempre foi solteira e nunca teve filhos, veio a óbito em 2011. Os irmãos “de criação” da falecida ingressaram com Ação Declaratória, requerendo o reconhecimento da fraternidade socioafetiva com base no art. 1.593 do Código Civil.

 

Percebam a luta processual dos colegas advogados:

  1. O magistrado de primeira instância extinguiu a ação, sem análise de mérito, alegando impossibilidade jurídica do pedido;
  2. O Tribunal de Justiça negou provimento por entender que não cabia o reconhecimento da fraternidade socioafetiva;
  3. Os embargos de declaração foram rejeitados;
  4. Os recorrentes interpuseram Recurso Especial, que teve seguimento negado em juízo provisório de admissibilidade;
  5. Interposto Agravo, o Ministério Público Federal manifestou-se pelo desprovimento;
  6. Em decisão monocrática, determinou-se a reautuação para análise da controvérsia.

Ou seja, uma situação processual bastante desafiadora.

 

Passaremos ao Voto:

Voto do Relator: Ministro Marco Buzzi

Entendeu que há sim possibilidade jurídica do pedido com base no art. 1.593 do Código Civil.

Art. 1.593: O parentesco é natural ou civil, conforme resulte de consanguinidade ou outra origem.

O Relator considerou que a expressão “outra origem” inclui a fraternidade socioafetiva, além de discorrer sobre os princípios do afeto, fundamentais no Direito de Família.

Ao final, votou pela cassação da decisão e retorno dos autos à origem para instrução.

Voto Vencido: Ministro Raul Araújo

Entendeu que não cabia tal reconhecimento, pois primeiro deveria ter sido reconhecida a filiação socioafetiva, que daria origem à fraternidade socioafetiva. Determinou a confirmação da sentença devido à impossibilidade jurídica do pedido.

A Ministra Isabel Galotti acompanhou o voto do Ministro Raul Araújo.

Voto de Vista: Ministro Antonio Carlos Ferreira: Acompanhou o voto do Relator.

Assim, ao final, prevaleceu o voto do Relator, cassando a sentença e determinando o retorno dos autos para instrução.

 

Conclusão:

Tema polêmico, mas vale a pena ler a decisão, pois ela oferece elementos para fundamentar um possível pedido de reconhecimento da fraternidade socioafetiva, sempre com muita atenção ao caso concreto e verificando também a possibilidade de reconhecimento da filiação socioafetiva, em conjunto.

 

Abraços,

Fernanda Haeming

 

Link da decisão:

Decisão de base: REsp 1.674.372 – SP

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